A contribuição da Didática para a prática docente no Ensino Superior
A Didática sempre desempenhou
um papel importante na formação de profissionais para o exercício do
magistério. Caracteriza-se como mediação entre as bases teórico-científicas da
educação e prática docente, operando como uma ponte entre “o que” e “como” do
processo pedagógico.
Candau (2004) fala da
importância da Didática como uma forma de tratar tecnicamente os mecanismos
pelos quais o educando possa adquirir determinados tipos de conduta com maior
facilidade. Assim, a Didática é importante para a aprendizagem dos modos de
conseguir, do ponto de vista do “saber fazer” que alguma coisa seja ensinada de
tal maneira que o educando possa aprender com maior facilidade e, por isso,
mais rapidamente.
Estudar a Didática é pensar
num conjunto de conhecimentos didáticos e pedagógicos, esclarecendo seu papel
na formação profissional para o exercício do magistério. Destarte, o professor
deve propor e examinar com os alunos os objetivos, conteúdos e atividades que
serão desenvolvidos, preparando-os para o processo de assimilação consciente de
conhecimentos e habilidades (LIBÂNEO, 1994).
Destarte, no ensino
universitário, a formação pedagógica dos professores requer impulsos criativos
e uma sistematização didática, que não implica necessariamente no processo de
inovação do ensino. As reflexões práticas surgem como uma forma de contemplar experiências
de formação pedagógica dos docentes do Ensino Superior, com base num trabalho
conjunto entre as Universidades, num constante processo de integração.
Estudos realizados por
Lucarelli (1994) trazem três importantes reflexões acerca da inovação e
formação do docente universitário:
Identificação das inovações:
faz-se uma associação a práticas de ensino que alterem, de algum modo, o
sistema unidirecional das relações que caracterizam o ensino tradicional. O
sistema de relações centrado apenas na transmissão da informação, emitida pelo
docente, presente em um impresso ou veiculada por qualquer meio tecnológico
mais sofisticado como o que se produz pela comunicação virtual; um processo de
inovação na aula supõe sempre que haja uma ruptura com os modelos didáticos
impostos pela epistemologia positivista, o qual comunica um conhecimento
fechado, acabado, conducente e uma didática da transmissão que, regida pela
racionalidade técnica, reduz o estudante a um sujeito destinado a receber
passivamente este conhecimento (LUCARELLI, 1994).
Reconhecimento das principais
vias de concretização dessa articulação nas representações sociais dos atores
interessados na inovação: o estilo inovador encontra-se fundamentado na tríade
sujeito docente/aluno/conteúdo, o que supõe uma modificação do modelo didático
e de sua organização de tal maneira que os propósitos, os conteúdos, as
estratégias, os recursos, o papel que desempenha o docente, o papel do aluno e,
sobretudo, o sistema de relações entre esses componentes sejam afetados
(LUCARELLI, 1994).
Análise em profundidade das
modalidades particulares de transposição para a aula universitária dessa visão
da inovação na articulação entre teoria e prática: este processo de inovação
implica numa melhor relação entre a teoria e a prática. A prática do professor
é um elemento aglutinador para incorporação dos problemas significativos que
afetam o exercício profissional vigente em um campo determinado. A articulação
entre teoria e prática revela-se como uma estratégia metodológica para o
desenvolvimento de qualquer situação de ensino e aprendizagem (LUCARELLI,
1994).
De forma geral, percebe-se que
um dos maiores obstáculos para o desenvolvimento de inovações nas instituições
educativas é a distância entre a programação de inovação e sua incorporação na
prática cotidiana dos atores.
Existe também o grande
problema da articulação entre a teoria e a prática que clama por um caminho
legítimo na busca de ancoragens para a construção didática no âmbito
universitário (LUCARELLI, 2000).
Portanto, trata-se de definir
uma metodologia que inclua os protagonistas do ensino em sua análise e projeção
teórica, colocando-os em busca de estratégias possíveis, ao mesmo tempo,
comprometidas, para abandonar e encarar a resolução dos problemas que afetam o
ensino universitário.
BIBLIOGRAFIA
CANDAU, Vera Maria. A didática
em questão. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.
LIBÂNEO, José Carlos.
Didática. São Paulo: Cortez, 1994.
LUCARELLI, Elisa. Teoría e
práctica coo innovación em docência, investigación y actualización pedagógica.
Caderno de investigacion, n. 10, Buenos Aires:IICE/FFyL/UBA, 1994.
Fonte: https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/educacao/a-contribuicao-da-didatica-para-a-pratica-docente-no-ensino-superior/57837
Paulo Freire
Paulo Freire (1921-1997) foi o
mais célebre educador brasileiro, com atuação e reconhecimento internacionais.
Conhecido principalmente pelo método de alfabetização de adultos que leva seu
nome, ele desenvolveu um pensamento pedagógico assumidamente político. Para
Freire, o objetivo maior da educação é conscientizar o aluno. Isso significa,
em relação às parcelas desfavorecidas da sociedade, levá-las a entender sua
situação de oprimidas e agir em favor da própria libertação. O principal livro
de Freire se intitula justamente Pedagogia do Oprimido e os conceitos nele
contidos baseiam boa parte do conjunto de sua obra.
Ao propor uma prática de sala
de aula que pudesse desenvolver a criticidade dos alunos, Freire condenava o
ensino oferecido pela ampla maioria das escolas (isto é, as "escolas
burguesas"), que ele qualificou de educação bancária. Nela, segundo Freire,
o professor age como quem deposita conhecimento num aluno apenas receptivo,
dócil. Em outras palavras, o saber é visto como uma doação dos que se julgam
seus detentores. Trata-se, para Freire, de uma escola alienante, mas não menos
ideologizada do que a que ele propunha para despertar a consciência dos
oprimidos. "Sua tônica fundamentalmente reside em matar nos educandos a
curiosidade, o espírito investigador, a criatividade", escreveu o
educador. Ele dizia que, enquanto a escola conservadora procura acomodar os
alunos ao mundo existente, a educação que defendia tinha a intenção de
inquietá-los.
Aprendizado conjunto
Freire criticava a idéia de
que ensinar é transmitir saber porque para ele a missão do professor era
possibilitar a criação ou a produção de conhecimentos. Mas ele não comungava da
concepção de que o aluno precisa apenas de que lhe sejam facilitadas as
condições para o auto-aprendizado. Freire previa para o professor um papel
diretivo e informativo - portanto, ele não pode renunciar a exercer autoridade.
Segundo o pensador pernambucano, o profissional de educação deve levar os
alunos a conhecer conteúdos, mas não como verdade absoluta. Freire dizia que
ninguém ensina nada a ninguém, mas as pessoas também não aprendem sozinhas.
"Os homens se educam entre si mediados pelo mundo", escreveu. Isso
implica um princípio fundamental para Freire: o de que o aluno, alfabetizado ou
não, chega à escola levando uma cultura que não é melhor nem pior do que a do
professor. Em sala de aula, os dois lados aprenderão juntos, um com o outro - e
para isso é necessário que as relações sejam afetivas e democráticas,
garantindo a todos a possibilidade de se expressar. "Uma das grandes
inovações da pedagogia freireana é considerar que o sujeito da criação cultural
não é individual, mas coletivo", diz José Eustáquio Romão, diretor do
Instituto Paulo Freire, em São Paulo.
A valorização da cultura do aluno é a chave para o processo de conscientização preconizado por Paulo Freire e está no âmago de seu método de alfabetização, formulado inicialmente para o ensino de adultos. Basicamente, o método propõe a identificação e catalogação das palavras-chave do vocabulário dos alunos - as chamadas palavras geradoras. Elas devem sugerir situações de vida comuns e significativas para os integrantes da comunidade em que se atua, como por exemplo "tijolo" para os operários da construção civil.
Diante dos alunos, o professor mostrará lado a lado a palavra e a representação visual do objeto que ela designa. Os mecanismos de linguagem serão estudados depois do desdobramento em sílabas das palavras geradoras. O conjunto das palavras geradoras deve conter as diferentes possibilidades silábicas e permitir o estudo de todas as situações que possam ocorrer durante a leitura e a escrita. "Isso faz com que a pessoa incorpore as estruturas lingüísticas do idioma materno", diz Romão. Embora a técnica de silabação seja hoje vista como ultrapassada, o uso de palavras geradoras continua sendo adotado com sucesso em programas de alfabetização em diversos países do mundo.
A valorização da cultura do aluno é a chave para o processo de conscientização preconizado por Paulo Freire e está no âmago de seu método de alfabetização, formulado inicialmente para o ensino de adultos. Basicamente, o método propõe a identificação e catalogação das palavras-chave do vocabulário dos alunos - as chamadas palavras geradoras. Elas devem sugerir situações de vida comuns e significativas para os integrantes da comunidade em que se atua, como por exemplo "tijolo" para os operários da construção civil.
Diante dos alunos, o professor mostrará lado a lado a palavra e a representação visual do objeto que ela designa. Os mecanismos de linguagem serão estudados depois do desdobramento em sílabas das palavras geradoras. O conjunto das palavras geradoras deve conter as diferentes possibilidades silábicas e permitir o estudo de todas as situações que possam ocorrer durante a leitura e a escrita. "Isso faz com que a pessoa incorpore as estruturas lingüísticas do idioma materno", diz Romão. Embora a técnica de silabação seja hoje vista como ultrapassada, o uso de palavras geradoras continua sendo adotado com sucesso em programas de alfabetização em diversos países do mundo.
Seres inacabados
O método Paulo Freire não visa
apenas tornar mais rápido e acessível o aprendizado, mas pretende habilitar o
aluno a "ler o mundo", na expressão famosa do educador.
"Trata-se de aprender a ler a realidade (conhecê-la) para em seguida poder
reescrever essa realidade (transformá-la)", dizia Freire. A alfabetização
é, para o educador, um modo de os desfavorecidos romperem o que chamou de
"cultura do silêncio" e transformar a realidade, "como sujeitos
da própria história".
No conjunto do pensamento de Paulo Freire encontra-se a ideia de que tudo está em permanente transformação e interação. Por isso, não há futuro a priori, como ele gostava de repetir no fim da vida, como crítica aos intelectuais de esquerda que consideravam a emancipação das classes desfavorecidas como uma inevitabilidade histórica. Esse ponto de vista implica a concepção do ser humano como "histórico e inacabado" e consequentemente sempre pronto a aprender. No caso particular dos professores, isso se reflete na necessidade de formação rigorosa e permanente. Freire dizia, numa frase famosa, que "o mundo não é, o mundo está sendo".
No conjunto do pensamento de Paulo Freire encontra-se a ideia de que tudo está em permanente transformação e interação. Por isso, não há futuro a priori, como ele gostava de repetir no fim da vida, como crítica aos intelectuais de esquerda que consideravam a emancipação das classes desfavorecidas como uma inevitabilidade histórica. Esse ponto de vista implica a concepção do ser humano como "histórico e inacabado" e consequentemente sempre pronto a aprender. No caso particular dos professores, isso se reflete na necessidade de formação rigorosa e permanente. Freire dizia, numa frase famosa, que "o mundo não é, o mundo está sendo".
Três etapas rumo à conscientização
Embora o trabalho de
alfabetização de adultos desenvolvido por Paulo Freire tenha passado para a história
como um "método", a palavra não é a mais adequada para definir o
trabalho do educador, cuja obra se caracteriza mais por uma reflexão sobre o
significado da educação. "Toda a obra de Paulo Freire é uma concepção de
educação embutida numa concepção de mundo", diz José Eustáquio Romão.
Mesmo assim, distinguem-se na teoria do educador pernambucano três momentos
claros de aprendizagem. O primeiro é aquele em que o educador se inteira
daquilo que o aluno conhece, não apenas para poder avançar no ensino de
conteúdos mas principalmente para trazer a cultura do educando para dentro da
sala de aula. O segundo momento é o de exploração das questões relativas aos
temas em discussão - o que permite que o aluno construa o caminho do senso
comum para uma visão crítica da realidade. Finalmente, volta-se do abstrato
para o concreto, na chamada etapa de problematização: o conteúdo em questão
apresenta-se "dissecado", o que deve sugerir ações para superar
impasses. Para Paulo Freire, esse procedimento serve ao objetivo final do
ensino, que é a conscientização do aluno.
Biografia
Paulo Freire nasceu em 1921 em
Recife, numa família de classe média. Com o agravamento da crise econômica
mundial iniciada em 1929 e a morte de seu pai, quando tinha 13 anos, Freire
passou a enfrentar dificuldades econômicas. Formou-se em direito, mas não
seguiu carreira, encaminhando a vida profissional para o magistério. Suas
idéias pedagógicas se formaram da observação da cultura dos alunos - em
particular o uso da linguagem - e do papel elitista da escola. Em 1963, em
Angicos (RN), chefiou um programa que alfabetizou 300 pessoas em um mês. No ano
seguinte, o golpe militar o surpreendeu em Brasília, onde coordenava o Plano
Nacional de Alfabetização do presidente João Goulart. Freire passou 70 dias na
prisão antes de se exilar. Em 1968, no Chile, escreveu seu livro mais
conhecido, Pedagogia do Oprimido. Também deu aulas nos Estados Unidos e na
Suíça e organizou planos de alfabetização em países africanos. Com a anistia,
em 1979, voltou ao Brasil, integrando-se à vida universitária. Filiou-se ao
Partido dos Trabalhadores e, entre 1989 e 1991, foi secretário municipal de
Educação de São Paulo. Freire foi casado duas vezes e teve cinco filhos. Foi
nomeado doutor honoris causa de 28 universidades em vários países e teve obras
traduzidas em mais de 20 idiomas. Morreu em 1997, de enfarte.
Tempos de mobilização e
conflito
Aula em Angicos, em 1963: 300
pessoas alfabetizadas pelo método Paulo Freire em um mês. Foto:
acervo fotográfico dos arquivos Paulo Freire do Instituto Paulo
Freire
O ambiente político-cultural
em que Paulo Freire elaborou suas idéias e começou a experimentá-las na prática
foi o mesmo que formou outros intelectuais de primeira linha, como o economista
Celso Furtado e o antropólogo Darcy Ribeiro (1922-1997). Todos eles despertaram
intelectualmente para o Brasil no período iniciado pela revolução de 1930 e
terminado com o golpe militar de 1964. A primeira data marca a retirada de cena
da oligarquia cafeeira e a segunda, uma reação de força às contradições criadas
por conflitos de interesses entre grandes grupos da sociedade. Durante esse
intervalo de três décadas ocorreu uma mobilização inédita dos chamados setores
populares, com o apoio engajado da maior parte da intelectualidade brasileira.
Especialmente importante nesse processo foi a ação de grupos da Igreja
Católica, uma inspiração que já marcara Freire desde casa (por influência da
mãe). O Plano Nacional de Alfabetização do governo João Goulart, assumido pelo
educador, se inseria no projeto populista do presidente e encontrava no
Nordeste - onde metade da população de 30 milhões era analfabeta - um cenário
de organização social crescente, exemplificado pela atuação das Ligas Camponesas
em favor da reforma agrária. No exílio e, depois, de volta ao Brasil, Freire
faria uma reflexão crítica sobre o período, tentando incorporá-la a sua teoria
pedagógica.
Para pensar
Um conceito a que Paulo Freire
deu a máxima importância, e que nem sempre é abordado pelos teóricos, é o de
coerência. Para ele, não é possível adotar diretrizes pedagógicas de modo
conseqüente sem que elas orientem a prática, até em seus aspectos mais corriqueiros.
"As qualidades e virtudes são construídas por nós no esforço que nos
impomos para diminuir a distância entre o que dizemos e fazemos", escreveu
o educador. "Como, na verdade, posso eu continuar falando no respeito à
dignidade do educando se o ironizo, se o discrimino, se o inibo com minha
arrogância?" Você, professor, tem a preocupação de agir na escola de
acordo com os princípios em que acredita? E costuma analisar as próprias
atitudes sob esse ponto de vista?
Fonte: https://novaescola.org.br/conteudo/460/mentor-educacao-consciencia
DIDÁTICA E DOCÊNCIA: FORMAÇAO E TRABALHO DE
PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA (*)
José Carlos Libâneo
Este artigo foi escrito a
partir de comunicação apresentada no I Simpósio sobre Ensino de Didática
promovido pelo Laboratório de Estudos e Pesquisas em Didática e Formação de
Professores (Leped), da Faculdade de Educação da UFRJ. Foi gratificante para o
autor compartilhar com investigadores e professores-formadores de vários
lugares do país presentes nesse evento, do esforço conjunto pelo
desenvolvimento teórico e prático da didática. Há razões muito sólidas para
valorizar esse esforço. Estão à nossa frente desafios postos pela escola
pública brasileira, entre eles as dificuldades dos educadores em se acertarem
em relação a objetivos, funções e formas de funcionamento das escolas, trazendo
prejuízos às ações de ensino-aprendizagem. Persistem graves problemas na
formação de professores como as debilidades da legislação, os diferentes
formatos curriculares entre os cursos de formação de professores para os anos
iniciais do ensino fundamental e os dos anos posteriores, a dicotomia entre o
conhecimento disciplinar e o conhecimento pedagógico-didático, a precariedade
do conhecimento profissional específico propiciado pela didática, as didáticas
específicas e as metodologias e tecnologias de ensino. No entanto, a despeito
desses impasses, também fazem parte desse esforço teórico e prático pela
pesquisa e ensino da didática um número imenso de professores-formadores
ensinando nos cursos de licenciatura em nosso país, para os quais nossos
estudos e pesquisas são de grande utilidade. Temos, pois, tarefas incessantes e
inadiáveis em relação ao campo disciplinar, investigativo e profissional da
didática e das didáticas específicas.
O texto apresenta ideias
sobre os conceitos fundantes da didática e sua aplicação pelos professores,
situando-os nos embates correntes no campo teórico da educação. Tem como
pressuposto que a didática está no centro da formação profissional de
professores como disciplina pedagógica, campo de investigação e de exercício
profissional. Também se acredita que o desenvolvimento da didática como ciência
profissional do professor requer dos pesquisadores e professores-formadores
clareza dos marcos teóricos e conceituais que fundamentam os saberes
profissionais a serem mobilizados para a ação docente, de modo a articular na
formação profissional a teoria e a prática. Tem havido esforços consideráveis
nessa direção. A produção intelectual em didática tem sido profícua, abrangendo
questões teóricas e epistemológicas, questões do exercício docente, da didática
específica das disciplinas, do estágio e das práticas de ensino, da articulação
entre a didática e as dimensões da cultura, a organização curricular para
formação inicial e continuada. Empenhado nesse esforço investigativo,
especialmente alinhando-me ao lado de pesquisadores mais sensíveis ao mundo da
escola e da sala de aula, permito-me mencionar minha intervenção no XIV Endipe (2008),
em Porto Alegre,
(*) Capítulo do livro: CRUZ, G.B.;
OLIVEIRA, A. T. C. C.; NASCIMENTO, M. B. C. A.; NOGUEIRA, M.A. (orgs.). Ensino
de didática: entre recorrentes e urgentes questões. Rio de Janeiro: Editora
Quartet, 2014.
Em que trabalhei a alegoria de que o campo investigativo e profissional da didática enfrentava o dilema entre a fidelidade ao seu objeto e o canto das sereias, representado pelas múltiplas tentativas de outros campos em solapar dela seu objeto ou substituí-lo por outros. Retomava, então, meu entendimento do objeto da didática: as relações ensino-aprendizagem de conteúdos específicos em situações concretas. No XV Endipe (2010), em Belo Horizonte, levei a discussão sobre as relações entre a didática e a epistemologia das disciplinas, no entendimento de que a apropriação de conhecimentos está intimamente ligada à forma de constituição dos saberes (questão epistemológica) e com a relação do aluno com o objeto de conhecimento (questão psicopedagógica), buscando contribuições de Vigotsky e Davídov complementadas com posições de didatas franceses como Develay, Vergnaud, Meirieu, entre outros.
Em que trabalhei a alegoria de que o campo investigativo e profissional da didática enfrentava o dilema entre a fidelidade ao seu objeto e o canto das sereias, representado pelas múltiplas tentativas de outros campos em solapar dela seu objeto ou substituí-lo por outros. Retomava, então, meu entendimento do objeto da didática: as relações ensino-aprendizagem de conteúdos específicos em situações concretas. No XV Endipe (2010), em Belo Horizonte, levei a discussão sobre as relações entre a didática e a epistemologia das disciplinas, no entendimento de que a apropriação de conhecimentos está intimamente ligada à forma de constituição dos saberes (questão epistemológica) e com a relação do aluno com o objeto de conhecimento (questão psicopedagógica), buscando contribuições de Vigotsky e Davídov complementadas com posições de didatas franceses como Develay, Vergnaud, Meirieu, entre outros.
Nesta comunicação será reiterado meu entendimento de
que o objeto da didática é o processo de ensino-aprendizagem (processos nem
idênticos e nem separados) visando à relação com saberes em situações didáticas
contextualizadas. Após um breve
diagnóstico do lugar da didática no debate educacional, o texto oferece
contribuições para analisar as antinomias teórico-práticas presentes no campo
pedagógico-didático, explicitar conceitos centrais da didática e extrair daí
derivações para mudanças no campo investigativo e profissional.
1. Didática
como campo disciplinar e investigativo: um diagnóstico
A didática é um campo
disciplinar e investigativo ainda bastante questionado no campo da educação,
mas, também, visivelmente em expansão. Quanto aos questionamentos, são
conhecidas e identificáveis as resistências em reconhecê-la em seu status científico e em seu papel na
formação de professores. Pesquisadores e professores de cursos de licenciatura
a desprestigiam pela suposta fragilidade de seu objeto de estudo ou por seu
caráter demasiado antiquado e obsoleto, desmotivando os futuros professores
para seu estudo. As resistências se expressam, também, em críticas à tradição
iluminista da pedagogia, à dominância de métodos tradicionais e autoritários de
ensino, a uma visão de currículo monocultural. São conhecidos os embates
já bastante conhecidos entre a sociologia e a psicologia, desde os anos 1960,
os quais, ao lado de outros fatores, acabaram afetando negativamente os estudos
e a investigação em pedagogia e didática. Induzidos a abordar os fatos
educativos ora pelo viés sociológico, ora psicológico, ora cultural, os
pedagogos, a quem cabe orientar decisões concretas sobre a vida da escola e da
sala de aula, perderam a especificidade “pedagógica” de seu trabalho. Isso explica, em boa parte, a depreciação dos
estudos em pedagogia e didática no meio acadêmico e institucional
refletindo-se no esvaziamento teórico e na desvalorização da pesquisa
específica sobre ensino-aprendizagem e práticas de sala de aula, abrindo espaço
aos mencionados reducionismos. O insucesso das reformas curriculares do curso
de pedagogia contribuiu para ampliar a debilidade teórica na formação de novos
pedagogos.
Entre outras consequências desse quadro, verifica-se
na produção científica e em documentos oficiais da educação brasileira uma
clara redução da análise pedagógica das questões educacionais em contraste com
a prevalência da análise sociopolítica que aparece como discurso genérico,
distanciado do mundo da escola. Ou seja, o fator pedagógico-didático tem sido o
elo perdido entre as políticas públicas da educação e as práticas reais
das escolas e salas de aula. Como não se formam há décadas, rigorosamente
falando, pedagogos de profissão e pesquisadores na área do ensino, as políticas
educacionais e boa parte das pesquisas ignoram a realidade das salas de aula. É incômodo ler nas conclusões de Gatti e
Nunes (2009, p. 55) sobre os cursos de licenciatura em pedagogia que “a escola,
enquanto instituição social e de ensino, é elemento quase ausente nas ementas”
e, com isso, a formação profissional não é integrada ao contexto concreto em
que o profissional-professor irá atuar. Não surpreende que os temas da
escola e do ensino nas políticas educacionais estejam praticamente por conta de
organizações mantidas pelos reformadores empresariais da educação (Freitas,
2011), em que executivos e economistas passam a monitorar questões
pedagógico-didáticas.
Por outro lado, é forçoso
admitir que em boa parte dos cursos de formação de professores persiste a
didática prescritiva e instrumental acompanhada de uma pedagogia com conteúdos
e métodos tradicionais (Libâneo, 2010b), num contexto em que as questões de
ensino-aprendizagem se cercam de complexidade cada vez maior, exigindo
revisões, atualizações, relações com outros campos de investigação. Além disso,
não está fora de propósito o alerta feito em recentes estudos de que a produção
acadêmica na área da educação parece não estar chegando aos professores da
educação básica e nem levando a mudanças significativas na formação inicial e
continuada (Gatti; Nunes, 2009; Gatti; Barretto; André, 2011; Libâneo, 2010b),
portanto, afetando pouco o campo disciplinar e profissional.
Outra séria questão a
atingir o campo disciplinar e investigativo da didática é a dispersão e,
frequentemente, o desacordo, entre educadores, legisladores, políticos, técnicos
do MEC e Secretarias de Educação, pesquisadores, em relação aos objetivos,
funções e formas de funcionamento da escola pública (Libâneo, 2012a). Essa
falta de clareza e de consenso mínimo sobre critérios de qualidade da boa
educação para todos se projeta no planejamento de ações do sistema escolar, nos
currículos, nos objetivos do ensino, nas formas de organização e funcionamento
das escolas, na formação profissional de professores, nas práticas de
avaliação.
O problema da dispersão em torno de objetivos e formas
de funcionamento da escola pode ser melhor entendido pelas pressões acadêmicas
em cima da pedagogia e da didática conforme comentado, mas há que se considerar
com bastante ênfase o impacto da internacionalização das políticas educacionais
para os países emergentes e pobres.
Estudos bastante consistentes (De Tommasi;
Warde; Haddad, 1966; Frigotto; Ciavatta, 2003; Shiroma; Garcia; Campos, 2011; Akkari, 2011; e Freitas, 2011)
mostram a influência crescente de organismos transnacionais nas políticas
educacionais brasileiras, com repercussão visível na pedagogia, na didática,
nos currículos, na organização escolar, afetando significativamente as escolas
e salas de aula (Torres, 2001, Libâneo, 2012a, 2012b).
É sabido que o Banco Mundial
é uma instituição econômica supranacional cujo papel no cenário econômico é
atrelar metas educacionais a metas econômicas visando à equilibração da
economia mundial em função da globalização dos mercados, redução da ignorância
e da pobreza por meio de uma escola voltada ao atendimento das necessidades
“mínimas” de aprendizagem visando a empregabilidade e inserção dos indivíduos
no mundo da informação e do consumo. A escola concebida pelas agências
internacionais é a que busca atender a necessidades imediatas de sobrevivência,
ritmos e interesses individuais dos alunos, visando à proteção social para a
pobreza. Para isso, propõe conteúdos mínimos com base em competências e
habilidades cognitivas numa escola organizada como acolhimento e vivência
social, com claras intenções de harmonização das relações sociais. Trata-se de
combinar ensino baseado em resultados com proteção social, com evidente
esvaziamento dos conteúdos científicos e da formação para a reflexividade,
política essa que resulta numa escola do conhecimento para os ricos e de
proteção social para os pobres (Nóvoa, 2009; Freitas, 2011; Libâneo, 2012a).
Como escrevem Shiroma, Garcia e Campos, tais alterações na função social da
escola decorrentes da adesão a políticas internacionais deslocam os princípios que regem o campo do conhecimento
para os da sociabilidade em que a inclusão social dos sujeitos pela educação
“tem como finalidade manter os sujeitos incluídos socialmente, servindo de
estratégia social contra o esgarçamento do tecido social, uma vez que a
passagem pelos bancos escolares (...) não guarda nenhuma relação com
possibilidades de mobilidade social, mas é apresentada como uma forma de
inclusão social” (2011, p. 245). São características notórias das políticas
educacionais vigentes no Brasil e em outros países da América Latina.
Essas considerações
fornecem elementos para compreender a situação em que se encontra o campo
disciplinar e investigativo da didática tanto no âmbito acadêmico quanto no
âmbito das políticas educacionais oficiais. Em outros textos eu já comentava sobre as relações conflituosas entre a pedagogia, as
demais ciências da educação e as teorias denominadas grosso modo pós-modernas que, em minha opinião, desde os anos 1980
vêm contribuindo para o esvaziamento teórico e profissional da pedagogia e o
debilitamento, na pesquisa, dos aspectos pedagógico-didáticos no funcionamento
interno das escolas. (Libâneo, 2010, 2011a, 2011b). Por sua vez, as orientações
curriculares dos organismos multilaterais levaram os países emergentes a adotar
em seus sistemas de ensino a a escola de proteção social para a pobreza, em que
se juntam ações de acolhimento social com um ensino baseado em resultados.
Nesse tipo de escola, instrumentalizada apenas para resolver problemas sociais,
pedagogia e didática perdem espaço e, em decorrência, sai de cena a busca de um
currículo significativo para os alunos, o ensino baseado na formação de
conceitos visando ao desenvolvimento intelectual, a adequação dos conteúdos e
metodologias, as formas de avaliação processual, etc. Ou seja, compromete-se o
que deveria ser a finalidade própria da escola, o desenvolvimento intelectual
dos estudantes por meio dos conteúdos científicos e da formação cultural.
Em contrapartida, M. Young,
especialista em currículo, apoiando-se em Charlot e Vigotsky, não poderia ser
mais claro em relação ao papel desejável para as escolas:
O currículo precisa ser
visto como tendo uma finalidade própria, o desenvolvimento intelectual dos
estudantes. [...] O desenvolvimento intelectual é um processo baseado em
conceitos, não em conteúdos ou habilidades. Isso significa que o currículo deve
ser baseado em conceitos. [...] O conteúdo, portanto, é importante não como
fatos a serem memorizados, como no currículo antigo, mas porque sem ele os estudantes não podem
adquirir conceitos e, portanto, não desenvolverão sua compreensão e não
progredirão em seu aprendizado. [...] São os professores com sua pedagogia e
não os formuladores de currículo, que se servem do cotidiano dos alunos para
ajudá-los a se engajarem com os conceitos definidos no currículo e perceberem
sua relevância (2011, p. 614).
Se for esse o papel das
escolas, é precisamente nele que intervêm a pedagogia e a didática, contrariamente
a tendências vigentes de ignorá-las.
Essas considerações, no
entanto, pedem um alerta. Minhas críticas a certa sociologização do pensamento
pedagógico não levam à desconsideração das contribuições das chamadas ciências
da educação, como a política, a sociologia e a antropologia (e, claro, as
reflexões no âmbito da filosofia da educação), na compreensão do fenômeno
educativo. Insisto que o que recuso é o viés, ou seja, a análise das questões
da educação apenas a partir dos temas e métodos investigativos de um determinado
campo científico, principalmente quando tais campos depreciam ou ironizam ou
relegam a segundo plano a especificidade
pedagógica das questões educativas, ou seja, a atuação sobre a formação e o
desenvolvimento do ser humano por meio da assimilação da experiência humana
sociocultural pelo ensino, em condições materiais e sociais concretas. Também
minha crítica à escola de proteção social, tanto na visão neoliberal quanto na
visão progressista, não leva a desconsiderar a relevância de políticas de
atendimento à diferença e às diversidades sociais e culturais dos alunos. O que
contesto é a sobreposição da missão social da escola à sua missão pedagógica,
pois a principal missão social da escola é sua missão pedagógica, a formação
das capacidades intelectuais dos alunos por meio dos conteúdos, visando a sua
inserção crítica no mundo do trabalho, da cultura, da política.
A despeito dos problemas
apontados, a didática e as didáticas específicas formam um campo em expansão.
Primeiramente, não podemos nos esquecer de que essas disciplinas estão
presentes em praticamente todos os cursos de licenciatura do país, envolvendo,
por baixo, em torno de 30.000 professores, fato esse que, por si só,
justificaria sustentar estudos teóricos e investigativos. Além disso, embora
persista nos cursos de formação a didática instrumental, constata-se hoje uma
produção acadêmica consistente, aberta, interdisciplinar, abordando questões teóricas
e epistemológicas e temas como mediação pedagógica, ensino colaborativo, ensino
com pesquisa, interculturalidade no ensino, estágio supervisionado (entre
outros, Candau, 1984, 2002, 2003, 2011a, 2011b; Cunha, 1989; Oliveira, 1992,
1997; Pimenta, 1997, 2010; Veiga, 1996, 1999, 2010; André, 1995, 1997; Oliveira;
André, 2003; Marin, 2005; Pimenta; Lima,
2004; Franco, 2010, 2012).
Livros e artigos buscam
aproximações temáticas e práticas com os campos do currículo, da linguística,
dos estudos culturais, entre outros, tal como mostram estudos sobre produção
acadêmica em congressos e encontros (Oliveira, 1997; Pimenta, 2000; André,
2008). Começam a surgir trabalhos abordando aproximações mais estreitas entre didática e didáticas específicas,
didática e epistemologia das disciplinas, relações entre conhecimento do
conteúdo e conhecimento didático (por exemplo, Maldaner, 2000; Monteiro, 2007; Libâneo,
2010a; Marandino, 2011; Veiga, 2011). Há grupos com pesquisas voltadas para a
sala de aula em temas como metodologias de ensino de alfabetização e de
disciplinas, ensino e contextos socioculturais, ensino em ambientes virtuais,
educação infantil, aprendizagem e interações discursivas.
2.
Antigas e persistentes antinomias no campo pedagógico-didático
A investigação em didática
possui uma vasta tradição no contexto europeu em que, mesmo a partir de
diferentes orientações teóricas, se acentua como seu objeto de estudo as relações entre o ato de ensinar e a aprendizagem,
visando à formação do aluno.
Compreendemos
por doutrina geral do ensino (ou
também estruturação didática) ou didática,
a teoria da instrução e do ensino escolar de toda natureza em todos os níveis. [...]
Trata das questões gerais de todo ensino, comuns a todas as matérias e procura
expor os princípios e postulados que se apresentam em todas as matérias. [...] (Stocker, 1964, p. 6). Grifos do autor (Stocker)
O processo didático [...] tem seu centro no encontro formativo do
aluno com a matéria de ensino. [...] Todo ensino eficiente é mais do que mera
transmissão de material e exercitação de habilidades. Deve conduzir ao encontro
formativo com os conteúdos didáticos indicando, assim, ao aluno o caminho da
autoformação e, finalmente, despertar nele a aspiração cultural que repercutirá
através de toda a vida, para além da escola (Id., p. 23). Grifos do autor
O objeto da didática é o
processo de instrução e de ensino tomado em seu conjunto, ou seja, o conteúdo
do ensino refetido nos planos e programas docentes e nos livros didáticos, os
métodos e meios do ensino, as formas organizativas do ensino, o papel educativo
do processo docente, como também as condições que propiciam o trabalho ativo e
criador dos alunos e seu desenvolvimento intelectual (DANILOV, 1984, p. 10).
Na
relação educativa escolar há dois processos de mediação: aquele que liga o
sujeito aprendiz ao objeto de conhecimento (relação S-O), chamado de mediação
cognitiva, e aquele que liga o formador professor a essa relação S-O, chamado
mediação didática (Lenoir, 1999, p. 28).
No Brasil são, também, sustentadas posições semelhantes
no que diz respeito ao foco da didática no processo de ensino e aprendizagem.
Para Castro (2010), a didática é um
corpo de conhecimentos sobre o ensino, visando a ensinar algo a alguém. Um
elemento peculiar na definição do objeto da didática é a intencionalidade, ou
seja, é próprio do ensino pretender ajudar alguém a aprender, momento em que
entram em cena as ações didáticas visando a um encontro entre o ensinar e o
aprender. A mesma autora acrescenta: (...) o ideal de toda didática sempre foi
que o ensino produzisse uma transformação no aprendiz e que este, graças ao
aprendido, se tornasse diferente, melhor, mais capaz, mais sábio (Castro, 2001,
p.16). Por sua vez, Candau concebe a didática como “conhecimento de mediação e garante sua
especificidade garantida pela preocupação com a compreensão do processo
ensino-aprendizagem e a busca de formas de intervenção na prática pedagógica,
concebida como prática social (CANDAU, 1997, p. 74).
Além do entendimento de que as ações de
ensino-aprendizagem sejam consideradas em sua unidade, outros autores buscam
compreender as atividades do professor e do aluno como inseridas em contextos
históricos e sociais.
O trabalho docente consiste,
assim, na atuação do professor no ato educativo [...], mediando os processos
pelos quais o aluno se apropria ou se reapropria do saber de sua cultura e o da
cultura dominante, elevando-se do senso comum ao saber cientificamente
elaborado. Nesse caso, uma boa parte do campo da didática refere-se às
mediações, assumidas pelo professor, pelas quais promoverá o encontro formativo
entre o aluno com sua experiência social concreta e o saber escolar (Libâneo,
1984, p. 149).
Seu objeto de estudo
específico é a problemática do ensino enquanto prática de educação, é o estudo
do ensino em situação, em que a aprendizagem é a intencionalidade almejada, e
na qual os sujeitos imediatamente envolvidos (professor e aluno) e suas ações
(o trabalho com o conhecimento) são estudados nas suas determinações
histórico-sociais. [... ] O objeto de estudo da didática não é nem o ensino nem
a aprendizagem separadamente, mas o ensino e sua intencionalidade, que é a
aprendizagem, tomadas em situação (Pimenta,
2002, p. 63).
Também a relação da didática com as questões
epistemológicas é um tema presente na investigação. “Ensino envolve, necessariamente, o enfrentamento de questões de como
ocorre o conhecimento e da justificação e validação de resultados cognoscitivos,
implicando, portanto, a dimensão epistemológica” (Oliveira, 1997, 133).
A
despeito da clareza com que essas definições compreendem a didática, inclusive
por contemplarem elementos fortemente presentes hoje no debate do campo como a
relação da didática com os saberes ensinados, as peculiaridades da mediação
pedagógica, a articulação com a epistemologia das disciplinas, a ligação dos
conteúdos com as práticas sociais e culturais, entre outros, persistem
significativas antinomias, umas antigas,
outras mais recentes, reforçadas pela dinâmica das mudanças no campo social,
político, científico, cultural. A seguir, são pontuadas algumas dessas
antinomias.
Fragmentação entre ensino e aprendizagem – Analisando como se apresenta a problemática do
objeto de estudo da didática nos cursos de formação de professores das séries
iniciais (pedagogia) nos deparamos nas ementas de didática com uma grande
dispersão desse objeto, mas, principalmente, uma fragmentação do foco da
didática entre o ensino e a aprendizagem (Libâneo, 2010c). Na maior parte Davídov, dos currículos há uma
predominância de foco no ensino, já que boa parte das ementas reduz o programa
de didática aos elementos do plano de ensino. É visível a falta de unidade
conceitual entre ensino e aprendizagem. A didática tradicional aparece fortemente
ora com seu caráter instrumental, ora com um discurso genérico sobre educação e
ensino; o viés sociológico ignora as questões de aprendizagem ressaltando
práticas sociais e linguísticas; certas visões escolanovistas realçam apenas a
aprendizagem espontânea ou as características psicológicas dos alunos. De
alguma forma, tais tendências não conseguem assegurar a unidade entre ensino e
aprendizagem e suas relações mútuas, desconsiderando as implicações simultâneas
entre aspectos epistemológicos, psicológicos, sociais e pedagógicos do processo
de ensino e aprendizagem.
Centralização nos interesses e necessidades
individuais e sociais do aluno em contraposição à ênfase no conhecimento e na
aprendizagem – A par da incidência
historicamente explicável da contraposição entre pedagogias centradas no
professor/pedagogias centradas no aluno/pedagogias centradas na cultura, estão
presentes nas políticas para a escola orientações das políticas educacionais
transnacionais, em que o lugar do conhecimento e do desenvolvimento das funções
psicológicas superiores é substituído ora por um currículo instrumental e
imediatista, ora pelo currículo experiencial, visando ao atendimento a
necessidades individuais dos alunos e interesses pragmáticos do sistema de
ensino. O currículo instrumental sustenta-se em objetivos de
competências, o baseado em experiências em temas geradores ou projetos, com
forte ênfase em vivências
socioculturais e situações experienciais de socialização e integração social.
São características marcantes das propostas de educação identificadas por Nóvoa
como “transbordamento” das funções da escola. Ou seja, são ressaltadas nas
políticas educacionais as missões sociais da escola visando ao apoio às
crianças dos meios sociais menos favorecidos por meio de um conjunto de
competências sociais e culturais, em que se atribui à escola “relevante papel
assistencial e de compensação face à incapacidade das famílias para assegurarem
as condições necessárias ao desenvolvimento das crianças” (Nóvoa, 2009, p. 78).
O que se questiona nessas propostas curriculares não é o fato de o currículo
dar atenção às características individuais e sociais dos alunos, o que é
inerente a concepções pedagógicas críticas, mas a tendência de sobrepor (ou
subsumir) a missão social da escola à sua missão pedagógica, pondo em segundo
plano a especificidade da escola: a formação das capacidades intelectuais dos
alunos por meio dos conceitos científicos e da aprendizagem de cunho cognitivo.
Nóvoa menciona o dualismo de muitos sistemas de ensino: “as elites investem
numa educação (privada) que tem como elemento estruturante a aprendizagem,
enquanto as crianças dos meios mais pobres são encaminhadas para escolas
(públicas) cada vez mais vocacionadas para dimensões sociais e assistenciais” (Nóvoa,
2009, p. 79).
Separação conteúdo/método da ciência/metodologia do
ensino – Essa separação ocorre no
interior do processo de ensino de uma disciplina: transmite-se um conteúdo sem
levar em conta o percurso investigativo da ciência ensinada, de modo que a metodologia
de ensino das disciplinas é quase sempre trabalhada independentemente do
conteúdo. Essa tripla separação, no entanto, acontece de modo distinto nos
cursos de licenciatura para as séries iniciais (pedagogia) e nas licenciaturas
para as séries subsequentes. Nos primeiros, ocorre a ênfase no metodológico sem
referência ao conteúdo; nos segundos a ênfase no conteúdo separado da
metodologia de ensino, principalmente onde as disciplinas de licenciatura
acontecem no último ano do bacharelado (3 + 1). Em ambas as licenciaturas, o
conteúdo ou a metodologia de ensino estão separados do método da ciência, ou
seja, em nenhum caso se faz um estudo aprofundado da epistemologia e dos
processos de investigação da ciência ensinada nas suas relações com o ensino
dessa ciência. Com isso, conteúdo e metodologia do ensino desse conteúdo são
tratados separadamente.
Fragmentação entre o conhecimento do conteúdo
(conhecimento disciplinar) e o conhecimento pedagógico do conteúdo (didática e
didáticas disciplinares) – Do tópico anterior
resulta a dissociação, no currículo de formação, entre dois saberes
profissionais essenciais ao professor: o domínio do conteúdo e o domínio das
formas de promover a aprendizagem desse conteúdo pelo aluno, isto é, o
conhecimento pedagógico-didático do conteúdo. Fica evidenciada a falta de
vínculos entre didática e epistemologia das ciências ou entre a didática básica
e as didáticas disciplinares ou, ainda, entre conhecimento pedagógico e
conhecimento disciplinar. Os princípios da organização conceitual da matéria
ensinada e o processo de constituição desses conceitos não aparecem nos
procedimentos didáticos pelos quais temas e problemas da matéria são
“didatizados” para a compreensão dos alunos. A mesma dissociação apontada no
tópico anterior reaparece agora na composição curricular dos cursos. Enquanto
na formação de professores para as séries iniciais em que se forma o professor
polivalente a separação conteúdo-forma se caracteriza pela predominância das
formas (isto é, do “metodológico”), sem conexão com os conteúdos (as conhecidas
“metodologias de...”), nas demais licenciaturas em que se forma o professor
especialista em um conteúdo há uma visível ênfase nos conteúdos sem conexão com
a metodologia de seu ensino. A situação piora quando a formação pedagógica está
nos anos finais pós-bacharelado, em que os conteúdos específicos somem. Em
ambos os casos, verifica-se a dissociação entre aspectos indissociáveis na
formação docente, ou seja, entre o conhecimento do conteúdo (conteúdo) e o
conhecimento pedagógico do conteúdo (forma).
Desconexão entre a didática básica (também chamada
de “geral”) e as didáticas específicas. Essa
é a consequência inevitável da problemática apontada nos tópicos anteriores:
professores de didática provenientes da pedagogia tendem a reduzir as práticas
de ensino aos elementos do planejamento, a técnicas de ensino, a metodologias
estereotipadas (i. e., invariáveis, aplicadas indistintamente a todas as
disciplinas) separadas dos procedimentos investigativos da ciência ensinada,
como se existisse uma didática “genérica”; por outro lado, professores das
didáticas específicas desdenham os saberes pedagógico-didáticos (“para ensinar
física, basta saber física”) e criticam os professores que ensinam didática,
mas não conhecem os conteúdos específicos das matérias. O resultado desse
desencontro tem sido a autonomização e a separação entre o conteúdo
da didática e o das didáticas específicas. Enquanto os professores das
didáticas específicas tendem a
considerar dispensável uma didática tida como “geral”, os pertencentes à
pedagogia fazem reparos ao pouco interesse de seus colegas pelos saberes
pedagógicos, como as teorias da educação, a psicologia da aprendizagem, as
teorias do ensino e a própria didática (Libâneo, 2008).
Desconexão entre aspectos social-político-culturais
e aspectos pedagógico-didáticos implicados no ensino e aprendizagem – Essa questão se refere à já antiga e também
difícil interseção entre os conteúdos, os procedimentos de ensino e os
contextos socioculturais e institucionais nos quais os alunos participam e
vivenciam. Tende-se a tomar como momentos distintos o ato de ensinar conteúdos
e a vivência/conexão no currículo das práticas sociais. Desde o movimento da Escola
Nova são postas em evidência as necessidades e interesses dos alunos nos
processos educativos, assim como as várias teorias que destacam o papel da
sociedade, da comunidade, do cotidiano e de outras práticas sociais no processo
ensino-aprendizagem. Nesse sentido, vale lembrar concepções educacionais, por
exemplo, de Dewey, Paulo Freire, a educação compensatória, algumas concepções
de pedagogia social, os estudos em torno da cultura e do cotidiano. O problema
é que, muito frequentemente, as práticas sociais e cotidianas, inclusive
aquelas vividas na escola, são consideradas em si mesmas sem articulá-las com
os conteúdos e as atividades de ensino-aprendizagem. Ou seja, não se conectam
práticas sociais e práticas pedagógicas. Quando
levadas em conta no currículo, as práticas sociais e cotidianas são
assumidas ora como forma de gestão (a escola enquanto lugar de vivência de
práticas sociais), ora se transformam em disciplinas ou atividades
“extracurriculares” (caso, por exemplo, dos temas transversais ou sessões de
orientação dos alunos), como se, de um lado, estivessem os conteúdos e as
atividades “escolares” e, de outro, as práticas sociais e cotidianas.
3.
Conceitos centrais da didática na teoria histórico-cultural
Entre
várias perspectivas teóricas, realça-se aqui a teoria histórico-cultural em que
o campo disciplinar da didática tem como especificidade
epistemológica o processo instrucional que orienta e assegura a unidade entre o
aprender e o ensinar, na relação com um saber, em situações contextualizadas,
nas quais o aluno é orientado em sua atividade autônoma pelos adultos ou
colegas, para apropriar-se dos produtos da experiência humana na cultura e na
ciência, visando ao desenvolvimento humano. Esse processo é designado mediação didática, isto é, mediação da
atividade de aprendizagem do aluno em suas relações com os objetos de
conhecimento, em contextos sociais e culturais concretos, em que se articulam o
ensino, a aprendizagem e o desenvolvimento humano (intelectual, afetivo,
moral).
Entre os elementos
constitutivos dessa formulação, o primeiro é a unidade entre ensino e
aprendizagem, expressa na palavra russa obutchenie,
cuja tradução literal é instrução
(Prestes, 2012, p. 224 e 225). Essa palavra, diferentemente do significado
convencional no Brasil de transmissão de conhecimento, com conotação
pejorativa, se refere na língua russa ao processo simultâneo de instrução,
ensino, estudo, aprendizagem. A instrução, assim, é a forma de organização
intencional do processo de apropriação, na qual estão implicados o ensino (o
que o professor faz) e a aprendizagem (o que o aluno faz), ou seja, o ensinar
por meio da atuação de outra pessoa no processo de aprendizagem[1].
O segundo refere-se ao entendimento, na perspectiva
histórico-cultural, de que a aprendizagem envolve a apropriação pelo
indivíduo da experiência social e histórica expressa nos conhecimentos e modos
de ação que, com a adequada orientação do ensino, levam ao desenvolvimento
mental, afetivo e moral dos alunos. A atividade de ensino, assim, é permeada
pela atividade social coletiva e pela atividade de aprendizagem individual.
Segundo Vigotsky, essa apropriação implica a transição de conhecimentos do
plano social externo (atividade social coletiva) para o plano individual
interno, o que implica o desenvolvimento de processos internos de
interiorização, em que o social se incorpora no individual. Ou seja, por um
lado, os processos psicológicos superiores estão enraizados no desenvolvimento
social e cultural, e, por outro, a apropriação da experiência social humana
histórica ocorre por meio de uma atividade psicológica interna propiciada pelo
processo de ensino-aprendizagem.
O terceiro elemento diz respeito ao fato de que o
processo de apropriação envolve a formação de conceitos científicos para além
dos conceitos empíricos, cuja peculiaridade
consiste em que a principal função da escola é atuar no desenvolvimento do
pensamento dos alunos, introduzindo-os no domínio do caráter abstrato e
generalizante dos saberes, de modo que os alunos aprendem formando abstrações,
generalizações e conceitos. Desse modo, uma das questões mais centrais da
teoria histórico-cultural é saber de que forma os indivíduos aprendem a fazer
abstrações e generalizações de modo a ultrapassar os limites da experiência
sensorial imediata e como os professores atuam com a mediação didática para a
formação desses processos nos alunos. Assim, os objetos de conhecimento
(conteúdos) e o método pelo qual são investigados cientificamente são a base da
qual decorrem o método de ensino e as formas de organização da aprendizagem do
aluno (Libâneo, 2009). É importante assinalar que o processo de apropriação
consiste na reelaboração subjetiva de conhecimentos, capacidades e habilidades
constituídos socialmente a partir de ferramentas culturais já desenvolvidas
socialmente. Em síntese, “a apropriação é
o resultado da atividade empreendida pelo indivíduo quando ele aprende a
dominar métodos socialmente desenvolvidos de lidar com o mundo dos objetos e a
transformar esse mundo, os quais gradualmente tornam-se o meio da atividade
própria do indivíduo” (Davydov; Markova, 1987, p. 5).
O quarto elemento da
formulação acima põe em relevo que o processo de apropriação ocorre em
contextos de práticas sociais, culturais e institucionais, dada a natureza
social das funções psicológicas superiores. Com
isso, as atividades de uma disciplina na sala de aula orientadas para a
formação de processos mentais por meio dos conteúdos científicos precisam estar
articuladas com as formas de conhecimento cotidiano vivenciadas pelos alunos,
nas quais estão implicadas as práticas sociais e cotidianas e as diversidades
sociais e culturais que lhe são próprias.
Com base nessa formulação
teórica, se conclui que a didática se define como
um campo científico interdisciplinar cujo objeto é o ensino orientado para a
aprendizagem e cujo propósito é prover a organização adequada da atividade de
ensino e aprendizagem com vistas ao desenvolvimento de capacidades intelectuais
e formação da personalidade integral dos alunos. Em sua natureza, a didática
oferece as condições e os modos de mediação da relação dos alunos com os
objetos de conhecimento, com vistas à apropriação e internalização da
experiência social e histórica da humanidade expressa nos conteúdos científicos
e artísticos. A didática é uma disciplina pedagógica, ou seja, um ramo da
pedagogia, ao lado de outras disciplinas como a teoria da educação, a teoria da
organização escolar, a teoria da escola, psicologia educacional. Pode ser
entendida como uma disciplina unitária que abarca em seu campo
teórico-investigativo a didática básica (que compreende a teoria do ensino e as
características do ensino-aprendizagem em seu conjunto) e as didáticas
disciplinares que, em articulação com a didática básica, estuda as
peculiaridades do processo de ensino-aprendizagem de cada uma das disciplinas,
considerando sua lógica própria em conexão com os processos de aprendizagem em
contextos sociais e culturais.
A contribuição da teoria
histórico-cultural à didática é sumamente relevante, indicando o vínculo
explícito entre a didática e a lógica científica das disciplinas. Supõe uma
relação indissolúvel entre o plano epistemológico (da ciência ensinada) e o
plano didático, ou seja, o vínculo essencial entre conhecimento disciplinar e o
conhecimento pedagógico-didático. Uma síntese das considerações acima pode ser
expressa assim: a) A questão “campo do didático” se resolve, em primeira
instância, pelo papel do ensino em criar as condições para assegurar a relação
do aluno com um saber (mediação, compartilhamento de significados), levando a
uma mudança qualitativa nas relações com esse saber (transformação das relações
que o aluno mantém com os saberes); b) não há didática fora dos conteúdos e dos
métodos de investigação que lhes correspondem (não há conteúdos fora dos
métodos de cada ciência de constituição desses conteúdos); c) não há didática
fora da relação do aluno com o conteúdo (fora da transformação das relações do
aluno com o conteúdo); d) Não há didática separada das práticas socioculturais
e institucionais em que os alunos estão envolvidos, as quais impregnam os
conteúdos.
4. Derivações
para o campo investigativo e profissional
Mencionamos
anteriormente que a didática está no centro da formação profissional dos
professores, na condição de que seja capaz de investigar, definir e viabilizar
os saberes profissionais para a ação profissional. Sua ajuda aos professores
depende da rigorosidade como disciplina e como campo investigativo. Somente
assim pode ajudar profissionalmente aos professores, formulando marcos teóricos
e conceituais e perspectivas metodológicas que os ajudem a compreender como
assegurar a unidade do processo de ensino e aprendizagem e como atuar nas
situações didáticas. São apresentadas neste último tópico algumas derivações
pontuais sobre pistas para o fortalecimento do conteúdo da didática como
disciplina e como campo de investigação.
Superar a fragmentação
entre a atividade de ensino e a atividade de aprendizagem
Ensino e a aprendizagem
compõem uma unidade, não sendo termos nem idênticos nem separados. Conforme
Prestes:
Para Vigotski, a atividade obutchenie (instrução) pode ser definida
como uma atividade autônoma da criança, que é orientada por adultos ou colegas
e pressupõe, portanto, a participação ativa da criança no sentido de
apropriação dos produtos da cultura e da experiência humana. [...] uma
atividade autônoma da criança que é orientada por alguém que tem a
intencionalidade de fazê-lo (2012, p. 224).
Por sua vez, Pimenta escreve
que o objeto de estudo da didática é o ensino em situação, “em que a
aprendizagem é a intencionalidade almejada e na qual os sujeitos imediatamente
envolvidos (professor e aluno) e suas ações (o trabalho com o conhecimento) são
estudados nas suas determinações histórico-sociais” (1997, p. 63). A superação
da fragmentação mencionada depende do reconhecimento do caráter social do
ensino em que está presente a intencionalidade na orientação da atividade dos
alunos, no sentido de auxiliá-los em sua aprendizagem por meio de conteúdos de
tarefas de aprendizagem, como também de organização do ambiente social para a
atividade de aprendizagem e para o desenvolvimento humano. Ao mesmo tempo,
reconhece-se que a aprendizagem, enquanto relação do aluno com o processo de
conhecimento, implicando especialmente um processo de
mudança, de reorganização e enriquecimento do próprio aluno, na dependência de
sua participação ativa nesse processo. Ou seja, à didática cabe
assegurar a unidade entre o ensino e a aprendizagem, para o que precisa
recorrer às dimensões epistemológica, psicológica e sociológica.
Ter como referência
básica da didática a mediação da relação do aluno com os saberes (conteúdos) em
situações didáticas contextualizadas
O campo da didática ganhará
consistência ao reconhecer que não há didática que não tenha como foco a
relação com os conteúdos enquanto referência necessária para a formação das
capacidades intelectuais. O centro da atividade escolar não é o conteúdo em si
nem o aluno. Uma visão da didática baseada nos saberes a aprender se opõe tanto
a uma visão tradicional como a uma forte tradição escolanovista e de educação
popular em nosso país. Os conteúdos devem ser vistos como o conjunto de
conhecimentos científicos de uma disciplina, constituídos social e
historicamente, produtos da experiência social e histórica humana, considerados
importantes para promover o desenvolvimento mental dos alunos. Davydov escreve
que “o ensino realiza seu papel principal no desenvolvimento mental, antes de
tudo, por meio do conteúdo do conhecimento a ser assimilado” (1988, p. 172) uma vez que, ainda segundo esse autor, os conteúdos são os meios para a formação
dos processos mentais). Por isso, dizemos que a didática se ocupa dos processos
de ensino e aprendizagem referentes ao ensino de conteúdos específicos, em
situações socioculturais concretas.
Considerar a
inseparabilidade entre conteúdos e metodologias investigativas da ciência
ensinada
A didática e as didáticas
disciplinares operam em três planos: a lógica dos saberes (plano
epistemológico), a lógica da aprendizagem (plano psicológico), a lógica dos
contextos socioculturais e institucionais. No primeiro, trata-se de considerar
a gênese, estrutura e processos investigativos dos conteúdos e os modos de
organizá-los e ensiná-los em relação a cada campo científico. No segundo plano,
consideram-se as formas de aprendizagem dos alunos em relação à aquisição e à internalização
desses conteúdos. No terceiro, trata-se da interface necessária entre a
organização do ensino e as práticas socioculturais; mais especificamente, entre
os conceitos científicos e os cotidianos e locais envolvidos nas práticas dos
alunos. A didática busca a unidade entre esses planos. Especificamente em
relação ao primeiro plano, afirma-se que os métodos de ensino são derivados dos
processos investigativos pelos quais se chega à constituição de um conteúdo.
Isso quer dizer duas coisas: a) que os métodos de investigação de uma ciência
estão atrelados ao seu conteúdo: b) que os métodos de ensino de uma ciência são
inseparáveis dos métodos investigativos dessa ciência (Libâneo, 2009). O didata
francês Philippe Meirieu (1998, p. 118) descreve a mesma idéia de outra forma:
“nenhum conteúdo existe fora do ato que permite pensá-lo, da mesma forma que
nenhuma operação mental pode funcionar no vazio”. Ou seja, a formação de
capacidades mentais supõe os conteúdos, pois essas capacidades estão já
presentes nos processos investigativos e procedimentos lógicos da ciência
ensinada. A noção de conteúdo, portanto, está associada diretamente à formação
de capacidades mentais, no sentido de que a mediação didática do professor
consiste em traduzir os conteúdos de
aprendizagem em procedimentos
de pensamento. Ora, isso implica as características de aprendizagem dos alunos
em conexão com os contextos socioculturais e institucionais de aprendizagem.
Considerar
a inseparabilidade entre a didática e as didáticas específicas
Uma vez compreendida a
inter-relação entre a didática e a epistemologia das disciplinas, não há
separação possível entre a didática e as didáticas específicas. Elas são
interdependentes, pois o objeto de estudo de ambas é o processo de
ensino-aprendizagem, ambas visam a compreender a mediação didática dos
conteúdos para a aprendizagem e a promover e ampliar o desenvolvimento das
capacidades intelectuais dos alunos e a sua personalidade. A organização
pedagógico-didática dos conteúdos pressupõe uma análise epistemológica desses
conteúdos em que se analisam o objeto da ciência ensinada, seus métodos de
investigação e os resultados da investigação, junto com a análise
psicopedagógica das condições de ensino-aprendizagem. A didática (básica),
portanto, inclui entre seus conteúdos elementos da teoria do conhecimento e dos
processos de desenvolvimento e aprendizagem, implicações socioculturais do
ensino-aprendizagem e, especialmente, as peculiaridades epistemológicas das
disciplinas e de seus métodos de investigação. Essa didática, enquanto
teoria do ensino e aprendizagem, generaliza princípios e procedimentos obtidos
a partir das ciências da educação – psicologia, sociologia, antropologia, entre
outras – e das pesquisas resultantes das próprias disciplinas específicas,
pondo-os a serviço do processo de ensino e aprendizagem das disciplinas. Ela
oferece às disciplinas específicas o que é básico, essencial e comum ao ensino,
mas em íntima conexão com a lógica cientifica das disciplinas. Por sua vez, as
didáticas específicas (ou disciplinares), a partir dos saberes
pedagógico-didáticos sobre ensino e aprendizagem e da estrutura conceitual e
procedimentos investigativos da ciência ensinada, pressupõem conteúdos como
aspectos epistemológicos do processo geral do conhecimento, peculiaridades
epistemológicas da disciplina, processos e procedimentos investigativos da
disciplina, processos externos e internos do desenvolvimento humano e da
aprendizagem. Ou seja, as didáticas específicas têm como objeto de estudo as
peculiaridades do processo de ensino-aprendizagem de cada uma das disciplinas,
visando à sua organização pedagógico-didática, em correspondência com os níveis
de ensino a atender e características individuais e socioculturais dos alunos.
Em síntese, embora a didática e as didáticas específicas tenham cada uma sua
especificidade, elas formam uma unidade, já que são mutuamente referenciadas (Libâneo,
2008).
Integrar as práticas
socioculturais e institucionais, em que estão inseridas a diversidade humana e
as diferenças, às práticas pedagógico-didáticas no trabalho com os conteúdos
Na perspectiva
histórico-cultural, as práticas socioculturais vivenciadas pelos alunos são
integrantes das práticas pedagógicas, inseparáveis delas. Com efeito, as
práticas socioculturais e institucionais que crianças e jovens compartilham na
família, na comunidade e nas várias instâncias da vida cotidiana são, também,
determinantes na formação de capacidades e habilidades, na apropriação do conhecimento
e na identidade pessoal. Dessa forma, as práticas socioculturais aparecem na
escola tanto como contexto da aprendizagem quanto como conteúdo, influenciando
nas mudanças na aprendizagem e no desenvolvimento dos alunos. A integração
entre práticas socioculturais e práticas pedagógicas significa um movimento de
ida e volta entre os conceitos cotidianos trazidos pelos alunos e os conceitos
científicos presentes na matéria, de modo que o professor, ao propor tarefas de
aprendizagem aos alunos, faz integrar os conhecimentos científicos e as
práticas socioculturais de que os alunos participam e vivenciam. Vai-se dos
conceitos científicos à realidade concreta, e da realidade concreta do
conhecimento local e cotidiano para os conceitos abstratos de um conteúdo.
Hedegaard e Chaiklin denominam essa estratégia de “abordagem do duplo
movimento”. Eles escrevem:
Na abordagem do duplo movimento, o plano de ensino do
professor deve avançar de características abstratas e leis gerais de um
conteúdo para a realidade concreta, em toda a sua complexidade. Inversamente, a
aprendizagem dos alunos deve ampliar-se de seu conhecimento pessoal cotidiano
para as leis gerais e conceitos abstratos de um conteúdo (2005, p. 69 e 70).
Nesse entendimento, numa perspectiva crítico-social,
boa escola é a que se organiza de modo a articular a formação cultural e
científica com as práticas socioculturais (levando em conta a diversidade
social e cultural, redes de conhecimento, diferentes valores, etc.) de modo a
promover interfaces pedagógico-didáticas entre o conhecimento
teórico-científico e as formas de conhecimento local e cotidiano (Libâneo,
2012c). A escola, assim, assegura a
formação cultural e científica para todos, isto é, o desenvolvimento de
capacidades intelectuais por meio dos conteúdos, considerando, no processo
pedagógico, que essa formação se destina a sujeitos diferentes,
diferença como condição concreta do ser humano e das situações educativas.
Repensar o sentido da
investigação propriamente pedagógica: o que é ou deveria ser a pesquisa em
pedagogia e didática
No campo da didática e da
formação de professores, os procedimentos de pesquisa sobre o ensino têm sido
tomados, na maior parte das vezes, de empréstimo aos métodos investigativos da
sociologia, por exemplo, a pesquisa-ação. Enquanto isso, as pesquisas sobre
aprendizagem e sala de aula realizam-se, mais frequentemente, no campo da
psicologia. Procurei argumentar ao longo deste texto que o didático está na
confluência do epistemológico, do psicológico e do social. Tenho defendido que
a pesquisa em educação, em quaisquer das ciências da educação, deve
subordinar-se ao objeto da pedagogia que, a meu ver, são as ações e processos formativos propiciados
pelas várias modalidades de educação. O conceito que expressa essa ideia de
modo mais completo é este: a educação é uma prática social, materializada
numa atuação efetiva na formação e desenvolvimento de seres humanos, em
condições socioculturais e institucionais concretas, implicando práticas e
procedimentos peculiares, visando a mudanças qualitativas na aprendizagem
escolar e na personalidade dos alunos. Desse modo, a especificidade
do enfoque pedagógico-didático está nas formas pelas quais a educação e o
ensino, como práticas sociais, formam o desenvolvimento cognitivo, afetivo e
moral dos indivíduos. O resultado social, pedagógico, cultural, da escola expressa-se
nas aprendizagens efetivamente consumadas. Com isso, tenho o entendimento de
que toda pesquisa em educação, seja pelo lado da
sociologia, da psicologia, da antropologia, da economia, da história da
educação, da didática, seja pelo lado da cultura, do currículo, das políticas
sociais, da gestão do sistema de ensino e das escolas, etc., deve ter como
ponto de referência as ações e
processos formativos propiciados pelas várias modalidades de educação.
Considerar a
necessidade de mudança radical no formato curricular da formação profissional
de professores para a educação básica
Buscou-se argumentar neste
texto sobre a inseparabilidade entre didática e didáticas disciplinares,
didática e epistemologia da ciência ensinada, conhecimento pedagógico e conhecimento
disciplinar, o que leva a duas exigências para o exercício profissional dos
professores: o conhecimento do conteúdo e o conhecimento didático do conteúdo.
Conforme mencionado, as instituições formadoras no Brasil não têm conseguido
superar nos currículos a dissociação entre o conhecimento pedagógico e o
conhecimento disciplinar considerando-se, também, que essa separação tem
características muito diferentes quando se analisa a concepção de formação e
organização curricular do curso de licenciatura em pedagogia e nos demais
cursos de licenciatura. Desse modo, cada um desses percursos formativos
encontra o seu dilema. Na licenciatura em pedagogia põe-se assim: para entender o problema pedagógico da
mediação entre o sujeito e o conhecimento, apenas a formação pedagógica não é
suficiente. Essa é precisamente uma questão epistemológica. Nos demais
cursos de licenciatura o dilema põe-se inversamente: para entender como se ensina um conteúdo para que os alunos de
apropriem deles de modo significativo, somente o conhecimento do conteúdo é
insuficiente. Essa é precisamente uma questão pedagógico-didática.
A lógica da argumentação
trazida aqui sobre a inter-relação entre o conhecimento disciplinar e o
conhecimento pedagógico leva à conclusão de que o sistema de formação de
professores precisa buscar uma unidade no processo formativo em que essa
inter-relação possa ser assegurada. Tal unidade será garantida em um centro de
formação de professores para a educação básica (Libâneo; Pimenta, 1999). Essa
busca de unidade implica reconhecer que a formação inicial e continuada de
professores precisa estabelecer relações teóricas e práticas mais sólidas entre
a didática e a epistemologia das ciências, de modo a romper com a separação
entre conhecimentos disciplinares e conhecimentos pedagógico-didáticos. Isso
poderá ser assegurado se esses dois percursos formativos considerarem: a)
ênfase no estudo dos conteúdos que serão ensinados nas escolas da educação
básica; b) privilegiamento no ensino da relação conteúdo/método, em que os
métodos são reconhecidos a partir do conteúdo; c) garantia na formação
profissional da integração entre o conhecimento do conteúdo e o conhecimento
didático do conteúdo; d) assegurar a unidade entre as três lógicas: dos
saberes, das aprendizagens, dos contextos socioculturais.
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Fonte: http://www.scielo.br/pdf/edreal/2015nahead/2175-6236-edreal-46132.pdf
John
Amos Comenius
Professor,
cientista, escritor checo, considerado fundador da didática moderna.
Reconhece
o direito de todos os homens ao saber, com as propostas:
-
A educação realista e permanente;
-
Métodos pedagógico rápido, econômico e sem fadiga;
-
Ensinamento a partir de experiências cotidianas;
-
Conhecimento de todos as ciências e de todas as artes;
-
Ensino unificado.
Levou
em conta a diferença entre o ensinar e o aprender.
Publicou
em 1627 a Didática Magna, traduzida para o latim em 1631, devido a preocupação
com um dos grandes problemas de conhecimentos totais (epistemológico), o
método.
Foi
um dos primeiros a pensar na educação das crianças e a reconhecer o valor da
educação para elas. A primeira educação da criança era introduzida pelo
"colo da mãe" sendo desenvolvido dentro dos lares, defendendo então a
importância da tarefa dos pais quanto a educação de seus filhos. Comenius
defendia que o cultivo dos sentidos e da imaginação precedia o desenvolvimento
racional. Para o desenvolvimento da criança eram necessários materiais diversos
que seriam internalizados, tornando assim a experiência mais concreta e a
possibilidade do brincar e do aprender pelos sentidos. Foi em 1657 que Comenius
usou a imagem de "jardim-de-infância" onde as "arvorezinhas
plantadas" seriam regadas sendo assim comparada com o lugar da educação
das crianças pequenas, revelando a sua mais conhecida obra, a Didática Magna
(1627), onde faz analogia entre a educação de crianças e o cultivo de plantas.
Comenius organizou a didática em quatro períodos: a infância, a puerícia, a
adolescência e a juventude.
Comenius foi um importante pensador que introduziu
questionamentos acerca da educação de crianças menores de seis anos e o que
elas deveriam aprender. Comenius foi o criador da Didática Moderna e um dos
maiores educadores do século XVII; já no século 17, ele concebeu uma teoria
humanista e espiritualista da formação do homem que resultou em propostas
pedagógicas hoje consagradas ou tidas como muito avançadas. Entre essas ideias
estavam: o respeito ao estágio de desenvolvimento da criança no processo de
aprendizagem, a construção do conhecimento através da experiência, da
observação e da ação e uma educação sem punição, mas com diálogo, exemplo e
ambiente adequado. Comenius pregava ainda a necessidade da
interdisciplinaridade, da afetividade do educador e de um ambiente escolar
arejado, bonito, com espaço livre e ecológico. Estão ainda entre as ações
propostas pelo educador checo: coerência de propósitos educacionais entre
família e escola, desenvolvimento do raciocínio lógico e do espírito científico
e a formação do homem religioso, social, político, racional, afetivo e moral.
Comenius,
uma voz quase solitária em seu tempo, defendia a escola como o
"locus" fundamental da educação do homem, sintetizando seus ideais
educativos na máxima: "Ensinar tudo a todos", e que para ele,
significava os fundamentos, os princípios que permitiriam ao homem se colocar
no mundo não apenas como espectador, mas, acima de tudo, como ator. O objetivo
central da educação comeniana era formar o bom cristão, o que deveria ser sábio
nos pensamentos, dotado de verdadeira fé em Deus e capaz de praticar ações
virtuosas, estendendo-se a todos: os pobres, os portadores de deficiências, os
ricos, às mulheres. Suas concepções teóricas apresentavam consistência na
articulação entre suas diversas facetas: do filosófico ao religioso, passando
pela organização e divulgação do saber, pelo processo educativo de todos, e
pela reforma da sociedade; mas, nem por isso pode garantir que fossem postas em
prática de uma maneira mais ampla ou que obtivessem à sua época um maior
reconhecimento de seus pressupostos inovadores; logicamente no contexto
histórico da época e também da trajetória de vida do autor.
Não
podemos desvincular o que uma pessoa faz, da sua filosofia de vida, seus
ideais, sonhos, frustrações e experiências. Sua obra deve ser analisada no
contexto em que surgiu: o Renascimento e a Reforma religiosa. No que diz
respeito à Educação o ideal pansófico evidencia-se no desejo e possibilidades
de ensinar tudo e todos. Esta necessidade se forjava e se sustentava na crença
de que Deus, em sua infinita bondade, colocara a redenção ao alcance da maioria
dos seres humanos, mas para tanto era necessário educá-los convenientemente.
Dizendo
em outras palavras, para o autor, negar oportunidades educacionais era antes
ofender a Deus do que aos homens. A Pansofia constitui uma forma de organização
do saber, um projeto educativo e um ideal de vida. Para que se obtenha esse ideal
o processo a ser desenvolvido é a Pampaedia , ou educação universal através da
qual se conseguirá a reforma global das "coisas humanas" e um mundo
perfeito ou Panorthosia. Comenius aponta como necessária a constante busca do
desenvolvimento do indivíduo e do grupo, pois um melhor conhecimento de si
mesmo e uma melhor capacidade de autocrítica levam a uma melhor vida social,
assim como deve haver a solidez moral que pode ser conseguida por meio da
educação. Para ele, didática é ao mesmo tempo processo e tratado.
É
tanto o ato de ensinar como a arte de ensinar. A arte de ensinar é sublime pois
destina-se a formar o homem, é uma ação do professor no aluno, tornando-o
diferente do que era antes. Ensinar pressupõe conteúdo a ser transmitido, e
eles são postos pela própria natureza: são a instrução, a moral e a religião. O
conhecimento que temos da natureza serve de modelo para a exploração e
conhecimento de nós próprios. Mas não é a natureza "natural" o
exemplo a ser imitado, mas a natureza "social". Sua proposta
pedagógica dirige-se sobretudo à razão humana, convocando-a a assumir uma
atitude de pesquisa diante do universo e de visão integrada das coisas.
Pretendia que o homem deve ser educado com vistas à eternidade, pois, sendo
Espírito imortal, sua educação deveria transcender a mera realização terrena.
Salientava
a importância da educação formal de crianças pequenas e preconizou a criação de
escolas maternais por toda parte, pois deste modo as crianças teriam
oportunidades de adquirir desde cedo as noções elementares das ciências que
estudariam mais tarde. Comenius defendia a ideia de que a aprendizagem se
iniciava pelos sentidos, pois as impressões sensoriais obtidas através da
experiência com objetos seriam internalizadas e, mais tarde, interpretadas pela
razão. Seu método didático constituiu-se
basicamente de três elementos: compreensão, retenção e práticas. Através delas
se pode chegar a três qualidades fundamentais: erudição, virtude e religião, as
quais correspondem três faculdades que é preciso adquirir: intelecto, vontade e
memória. O método deve seguir os seguintes momentos: tudo o que se deve saber
deve ser ensinado; qualquer coisa que se ensine deverá ser ensinada em sua
aplicação prática, no seu uso definido; deve ensinar-se de maneira direta e
clara; ensinar a verdadeira natureza das coisas, partindo de suas causas;
explicar primeiro os princípios gerais; ensinar as coisas em seu devido tempo;
não abandonar nenhum assunto até sua perfeita compreensão; dar a devida
importância às diferenças que existem entre as coisas.
A
obra de Comenius constitui-se num paradigma do saber sobre a educação da
infância e da juventude, através de uma "nova tecnologia social": a
escola. A Didática Magna apresenta as características fundamentais da
instituição escolar moderna. Entre elas podemos apontar: a construção da
infância moderna já como forma da uma pedagogização dessa infância por meio da
escolaridade formal; uma aliança entre a família e a escola por meio da qual a
criança vai se soltando a influência da órbita familiar para a órbita escolar;
uma forma de organização da transmissão dos saberes baseada no método de
instrução simultânea, agrupando-se os alunos e, não menos importante, a
construção de um lugar de educador, de mestre, reservado para o adulto portador
de um saber legítimo. Tal plano se desenvolve tendo em vista a evolução do
homem da infância à juventude já antecipando ROUSSEAU.
O
método único e seus fundamentos naturais "não se consegue de uma só
semente produzir a mesma árvore? De um só método farei alunos capazes!"
Eis as razões pelas quais para o autor o de um só método se justifica: o fim é
o mesmo: sabedoria, moral e perfeição; todos são dotados da mesma natureza
humana, apesar de terem inteligências diversas; a diversidade das inteligências
é tão somente um excesso ou deficiência da harmonia natural; o melhor momento
para remediar excessos e deficiências acontece quando as inteligências são
novas.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
http://www.ebah.com.br/content/ABAAABt_8AF/trabalho-resumo-comenius
(visitado em 16/03/2018)
Cópia
Livro – Cap. 2 - O Império da Ordem - Comenius



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